Num tempo em que o plástico constitui uma ameaça para o ambiente, fazer a apologia do mesmo é não só ir contra a corrente como poder ferir suscetibilidades.
Apontado como um material nocivo, poluente, responsável pela causa de morte nos oceanos, tido como algo que as pessoas desejam freneticamente substituir, o plástico tornou-se o alvo a abater.
Patente no museu de Leiria, a exposição “Plasticidade – uma História dos Plásticos em Portugal” mostra um conjunto de objetos que vão desde materiais de construção a móveis, próteses, tintas, automóveis, computadores, obras artísticas… ilustrando como este material revolucionou a vida quotidiana.
A exposição corresponde uma das metas de um projeto coordenado por Maria Elvira Callapez, especialista em História dos Plásticos e investigadora na FCUL.
Distinguida com o prestigiado prémio Dibner, o qual seleciona museus e exposições que melhor comuniquem ao público a história da tecnologia, da indústria e da engenharia, esta exposição apresenta outro olhar sobre este tão mal-amado material.
O surgimento do plástico, no séc. XIX, teve desde logo uma causa nobre: salvar os elefantes. Isto porque se matavam elefantes para lhes retirar o marfim dos dentes com o qual se fazia, entre outros objetos, bolas de bilhar e, dada a escassez destes animais, em determinada altura, alguém teve a ideia de lançar um concurso para o fabrico destas peças com um material sintético.
Deve-se então ao investigador inglês, Alexander Parkes, a criação do primeiro plástico, “Parkesine”. O estudo e as técnicas desenvolvidas permitiram não só a criação das bolas de bilhar como cabos de facas, travessões, botões de punho, etc mas sucederam-se alguns problemas e o material teve de ser aperfeiçoado até se instalar definitivamente. Hoje é “uma macromolécula que existe para a eternidade”, refere a mesma especialista, exaltando as suas inúmeras qualidades, tantas que conseguiu destronar os materiais tradicionais até então. Era usual a utilização de peças como baldes de zinco, pesados e barulhentos, máquinas de costura em ferro, difíceis de transportar, ferros de engomar, em ferro, entre tantos outros, impossíveis de coadunar com a vida moderna. O plástico tornou-se num material de consumo generalizado e a sua aplicação na indústria alterou não só o processo de fabrico, usando-se técnicas de moldes, como as formas dos objetos foram alteradas. A indústria do mobiliário sofreu uma autêntica revolução devido ao baixo custo, à durabilidade e à democraticidade do seu uso.
A cadeira Panton foi a primeira cadeira em plástico que rapidamente se converteu num ícone da Pop Art, produzida apenas com uma operação maquinal e feita de uma só peça, com a forma de um S, foi criada pelo designer dinamarquês Verner Panton, na década de 1960.
Mas outras áreas como a medicina, em que este material é imprescindível, quer no fabrico de próteses, válvulas que se colocam no coração, fios de operação que depois serão assimilados pelo corpo, etc, torna impensável afastá-lo do quotidiano.
Por outro lado, imagens como a que Rich Horner captou ao mergulhar no mar, na Indonésia, e à qual se referiu como “Garrafas de plástico, copos de plástico, folhas de plástico, baldes de plástico, saquetas de plástico, palhas de plástico, cestos de plástico, sacos de plástico, mais sacos de plástico, plástico, plástico, muito plástico”, alarmam-nos obviamente.
Ou a fotografia de um trabalhador chinês numa operação de reciclagem de garrafas de plástico, nos arredores de Pequim.
A culpa não é do plástico, insiste Maria Elvira Callapez, mas sim de comportamentos pouco cívicos, não é o plástico que mata e sim as ações de má utilização. E acrescenta que nos anos 60, nos Estados Unidos, alguns trabalhadores morreram em fábricas de plástico, tendo logo sido atribuída a causa da morte ao material, quando o que aconteceu foi a inspiração de uma substância tóxica quando esses trabalhadores entraram nos reatores, para os limpar, afirmando que hoje isso já não acontece.
O modelo de sociedade consumista, surgido após a segunda guerra mundial, desencadeou uma vertigem de consumo, fomentada pela publicidade, que continua a criar novas necessidades e ansiedades.
A urgência de travar esta onda gigantesca tem trazido à razão algumas questões sobre o equilíbrio ambiental e nomeadamente sobre a ecologia, realçando-se a importância da política dos 3 Rs (reduzir, reutilizar e reciclar). Também uma maneira de estar na vida, minimalista, emerge um pouco por todo o lado, defendendo a redução e reutilização dos produtos.
São pessoas que, cansadas do consumo excessivo, perceberam que menos é mais, um pouco à semelhança do que o arquiteto Mies van der Rohe afirmou “less is more”, quando prescindiu da ornamentação e se concentrou no essencial, no depuramento da forma. A felicidade já não passa pelos bens e produtos de consumo com que enchiam as suas casas, agora dirigem a atenção para o exterior e para os comportamentos irresponsáveis de todos nós que, movidos pelo interesse e ambição de alguns, um dia sonhámos ser felizes adquirindo mais e mais.
Portanto, torna-se urgente adotar medidas que respeitem o ambiente, que privilegiem a reutilização e só depois a reciclagem, uma reciclagem com controlo e qualidade.
Há também a boa notícia de um grupo de cientistas da universidade de Portsmouth, no Reino Unido, ter melhorado uma enzima, intitulada “PETase”, capaz de digerir polietileno tereftalato (PET), um plástico duro que leva centenas de anos a degradar-se. Tendo sido descoberta, no Japão, uma bactéria que se alojava nos sedimentos de um centro de reciclagem de garrafas de plástico, tendo depois evoluído e começado a digerir o plástico, usando-o como principal fonte de energia, e produzindo uma enzima que esses investigadores começaram a estudar de uma maneira mais aprofundada a ponto de acreditarem que pode revolucionar o processo de reciclagem dos plásticos.
O plástico veio para ficar e é impensável viver sem ele, como tal devemos respeitá-lo mais, é o que esta exposição nos diz.