Os brinquedos óticos surgiram no início do séc. XIX, ainda antes do aparecimento do cinema, este, só no final, em 1895, foi apresentado publicamente através dos irmãos Lumière.
São eles o taumatrópio, popularizado em 1824 por John Ayrton Paris; depois, Joseph Plateau criou o fenaquistoscópio, em 1832; e surgiram ainda o zootrópio, o flipbook, o praxinoscópio e o teatro praxinoscópio, sendo estes dois últimos desenvolvidos e com maior aperfeiçoamento, a partir do zootrópio.
Taumatrópio
Fenaquistoscópio
Zootrópio
flipbook
praxinoscópio e o teatro praxinoscópio
Estes engenhos, rodados a uma determinada velocidade, imprimiam movimento à sequência das imagens aí representadas, facto que intrigava e divertia uma parte da população que acompanhava as invenções e investigações científicas da época, entre as quais, a perceção visual, nomeadamente a persistência retiniana. Ora, estes objetos comprovavam esse efeito.
O fascínio pelo movimento sempre esteve presente.
As representações mais antigas, como a arte parietal do paleolítico, por exemplo, já denotam o princípio ou a sugestão do movimento, visível em certos detalhes das figuras como a agitação das crinas ou a inclinação dos cascos. Trata-se de um movimento implícito, ao contrário do real, que implica uma deslocação de algo, no espaço, o caminhar de uma pessoa ou o voo de um pássaro.
Mas a animação das imagens tem feito igualmente o seu percurso na história, desde o remoto teatro de sombras, inventado pelos chineses, e chegado à Europa no séc. XVII, até outros como a lanterna mágica no séc. XVII, e os divertimentos óticos.
Também as teorias sobre a maneira como percecionamos o movimento foram evoluindo, tal como o próprio mecanismo da visão.
Assim, considerando o globo ocular e o processo de apreensão da imagem: sabendo que a luz, refletida pelos objetos, entra na pupila, atravessa uma lente, o cristalino, e é projetada, invertida, na retina, onde existem milhões de células como, por exemplo, os cones e os bastonetes que nos permitem ver o mundo a cores. Os cones reconhecem as cores e, os bastonetes, a luminosidade. À noite, só os bastonetes funcionam, enquanto os cones ficam inativos, daí não vermos as cores, no escuro. Também uma anomalia nestas células, pode originar o daltonismo, dificultando o reconhecimento das cores.
A imagem ao ser projetada invertida, na retina, é, contudo, posicionada corretamente pelo cérebro.
No seguimento deste processo, a imagem permanece na retina durante uma fração de segundo após esta se afastar do campo visual.
De acordo com a teoria da persistência retiniana ou persistência da visão, se for apresentada uma sequência de imagens, a uma velocidade superior a dezasseis imagens por segundo, estas, fundem-se umas nas outras não havendo qualquer interrupção devido a essa breve permanência da imagem anterior, e originando a sensação de movimento.
Em 1912, o psicólogo checo, Max Wertheimer, um dos fundadores da Teoria da Gestalt, desenvolveu experiências em que separa diferentes movimentos: o movimento beta, segundo o qual, perante duas imagens projetadas numa tela, em extremidades opostas e em rápida sucessão, são percecionadas como apenas uma imagem que atravessa o espaço e provoca a ilusão de movimento. Este movimento beta é vulgarmente confundido com o fenómeno phi que consiste em mostrar separadamente, duas linhas que se acendem e apagam em rápida sucessão e num curto intervalo de tempo, levando o observador a afirmar ter percecionado movimento entre as duas.
Outros estudos concluem que apenas o movimento percecionado nos brinquedos óticos está de acordo com os movimentos phi e beta, não incluindo aqui o movimento do cinema, a não ser como uma definição para a ilusão de movimento na teoria do cinema. Porém, outras questões surgem como a contestação ao conceito de observador passivo onde as imagens se projetam passivamente na retina sem que ele participe no que vê. Quer no cinema, quer na vida real, a interação com o que nos rodeia obriga a uma solicitação constante com o que se insere no campo visual, mas também com o que está fora e é essa ligação entre a nossa ação, os ângulos, a aproximação e o afastamento e o mundo em movimento que não cabe numa definição estática. O próprio Wertheimer afirmou não ser possível formular, considerando somente um processo periférico que ocorre no globo ocular, devendo examinar-se processos que se desenvolvem além da retina.
A construção de alguns brinquedos óticos em contexto de sala de aula, ilustra o processo de desenvolvimento e o fascínio do aparecimento da animação, tão diferente do que, atualmente, assistimos, onde a dinâmica do mundo virtual em que a imagem, o som e o texto acontecem em simultâneo e onde as inovações não cessam de nos surpreender, e onde a noção de tempo, tão díspar do ritmo cadenciado da primeira, se automatiza em gestos e movimentos que não contemplam recuos. Realizar um engenho destes é fazer um trajeto no tempo e experimentar a magia e a euforia dos primeiros inventores, é compreender o fenómeno da persistência retiniana e deleitar-se com o objeto estético.
Ana Guerreiro
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