Feeds:
Artigos
Comentários

Archive for Dezembro, 2021

nadal_Valentí Gubianas Escudé

A pequena mão desenha a árvore
onde uma estrela se aninha para dormir.
Que dia será o de amanhã
no meio dos escombros onde o eco da súplica
enlouquece os cães famintos?
Quadro trágico para uma noite assim.
A pequena mão pega na borracha
e tenta apagar toda a dor do mundo
e acender com um novo traço
a claridade que resgata a alma.
A estrela acorda numa copa alta
e segue o caminho do que sabe
até encontrar a pequena mão
que tudo reinventa à medida do que somos.
Quando o encontro acontece
já não é noite nem dia, tempo infinito,
mas apenas um lugar onde o choro das crianças
de súbito se transforma em cântico.

A pequena mão desenha tudo
o que falta desenhar para o sonho fazer sentido.
É uma mão frágil mas firme, apenas sábia,
e quando abre o livro azul das manhãs
é sempre para escrever as palavras
que o estrondo abafou nas cidades feridas.
A pequena mão desenha uma árvore,
uma estrela e uma mãe aflita.
Depois desenha uma linha de horizonte,
uma constelação e uma pequena arca.
Um traço basta para criar a luz.
Depois tudo é mistério e júbilo.
Que ao menos esta noite ninguém se esqueça
da árvore, da estrela, da lenda
e da magia da pequena mão afagando a vida.

José Jorge Letria, in ‘Antologia Poética’

imagem: Nadal, por Valentí Gubianas Escudé, via Pinzellades al Món

Read Full Post »

madalena

A imagem que eu escolhi é da autoria de Rui Carruço, um artista português. Este quadro representa, indubitavelmente, o retrato de Fernando Pessoa e demonstra a fragmentação que lhe é característica. Esta fragmentação representada, e consequente multiplicidade, é concordante com as vanguardas do tempo em que o poeta viveu, uma época de crise de valores, de rutura com o passado e de rumo ao futuro, um período caracterizado pelo início do Modernismo.

Analisando o quadro de Rui Carruço numa primeira abordagem, consigo observar a utilização de cores opostas, cores quentes e frias, segundo o modelo do círculo cromático, principalmente os tons azulados, pretos e alaranjados.

Já analisando a gravura de uma forma mais interpretativa, consigo ver as disposições de vários fragmentos repetidos, pertencentes à imagem original, a face de Fernando Pessoa, que sugere a original “multiplicidade individual” que define o autor.

As obras de Pessoa caracterizam-se, entre outros aspetos, pelo seu caráter racional e consciente, que prioriza a razão às emoções, e que leva, consequentemente, à tristeza e inveja dos que, na sua perfeita inconsciência, são felizes: “Ah, poder ser tu, sendo eu”[1]. Poemas como “Autopsicografia” e “Isto” são um claro exemplo desta afirmação.

Tendo sempre como base as características acima mencionadas, o poeta no seu processo criativo lidava com uma diversidade de temas e, destes, alguns acabavam por integrar algumas obras. Um destes temas foi a identidade, para que a figura remete.

Suposto isto, o poeta sujeitou-se a uma autorreflexão. No entanto, esta capacidade, que deveria permitir saber a identidade do poeta, revela-se infrutífera, dado que o sujeito em questão somente descobre que não se identifica com o que vê: “Eu vejo-me e estou sem mim,/Conheço-me e não sou eu.”[2].

Assim, acontece a fragmentação e consequente despersonalização representada na imagem, em que o “eu” torna-se o objeto da avaliação. Esta avaliação decorre porque o poeta, na insuficiência que a sua personalidade reflete ser, tenta, utilizando a razão, desmistificar todo o seu ser. Neste processo, retiram-se as características que fazem de uma pessoa, uma pessoa.

Conforme a imagem retrata, esta crise de identidade incita o poeta a conhecer-se a si próprio, e assim surgem os heterónimos, fragmentações aparentemente iguais, mas com personalidades e, por conseguinte, estilos criativos, completamente distintos: “Atento ao que sou e vejo,/Torno-me eles e não eu./ Cada meu sonho ou desejo/ É do que nasce e não meu.”[3]. Destes heterónimos, destacam-se Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos.

Concluindo, a imagem permite analisar a crise de identidade que despersonalizou, fragmentou, e multiplicou a personalidade do autor, e que, inquestionavelmente, é o núcleo do universo pessoano. Observa-se que mesmo não se “encaixando” entre si, todos os fragmentos formam um todo: Fernando Pessoa.

[1] “Ela canta, pobre ceifeira” – Fernando Pessoa

[2] “Gato que brincas na rua” – Fernando Pessoa

[3] “Não sei quantas almas tenho” – Fernando Pessoa

Madalena Vitorino, 12ºE

Read Full Post »

clara pereira

Esta pintura de Ricardo Ferrari, da coleção “Lembranças da minha Infância”, de 2012, transporta-nos para um tempo feliz, de brincadeiras tradicionais, de liberdade de movimentos, em que os próprios tons usados nos dão uma sensação de calor e harmonia.

Pode-se voltar à infância e escrever sobre esse regresso por muitos motivos. No caso de Pessoa e do seu ortónimo, quando escreve sobre isso, ele não revive esse tempo, já que não viveu uma infância particularmente feliz. É a sua razão que cria essas lembranças e emoções e o ajuda a enfrentar a realidade adulta: “E hoje que sinto aquilo que fui, minha vida flui, feita do que minto.”1

A fuga para uma ideia feliz da infância torna-se, ao mesmo tempo, num confronto com a ausência de felicidade que ele sente no momento em que escreve. Esse contraste entre o tempo em que a inocência  lhe permitia não pensar e o tempo presente, de confusão e sofrimento interiores, é também muito duro de aceitar: “ A criança que fui chora na estrada. Deixei-a ali quando vim ser quem sou; Mas hoje, vendo que o que sou é nada, quero ir buscar quem fui, onde ficou.”2

Na pintura, as crianças não têm rosto. Não é a sua história pessoal que interessa ao pintor. É , sim, transmitir a ideia de um início igual e cheio de esperança no futuro, lugar onde se pode voltar quando tudo deixa de fazer sentido: “Quando era criança vivi, sem saber, só para hoje ter aquela lembrança.”3

Fernando Pessoa e o pintor Ferrari inventam um tempo e é esse tempo que os sustentará no futuro, como se fosse uma bengala, a que recorrerão de cada vez que caírem.

  • Quando era criança”, Fernando Pessoa
  • “A criança que fui chora na estrada”, Fernando Pessoa
  • “Quando era criança”, Fernando Pessoa

Clara Pereira, 12ºB

Read Full Post »

Os brinquedos óticos surgiram no início do séc. XIX, ainda antes do aparecimento do cinema, este, só no final, em 1895, foi apresentado publicamente através dos irmãos Lumière.

São eles o taumatrópio, popularizado em 1824 por John Ayrton Paris; depois, Joseph Plateau criou o fenaquistoscópio, em 1832; e surgiram ainda o zootrópio, o flipbook, o praxinoscópio e o teatro praxinoscópio, sendo estes dois últimos desenvolvidos e com maior aperfeiçoamento, a partir do zootrópio.

Estes engenhos, rodados a uma determinada velocidade, imprimiam movimento à sequência das imagens aí representadas, facto que intrigava e divertia uma parte da população que acompanhava as invenções e investigações científicas da época, entre as quais, a perceção visual, nomeadamente a persistência retiniana. Ora, estes objetos comprovavam esse efeito.

O fascínio pelo movimento sempre esteve presente.

 As representações mais antigas, como a arte parietal do paleolítico, por exemplo, já denotam o princípio ou a sugestão do movimento, visível em certos detalhes das figuras como a agitação das crinas ou a inclinação dos cascos. Trata-se de um movimento implícito, ao contrário do real, que implica uma deslocação de algo, no espaço, o caminhar de uma pessoa ou o voo de um pássaro.

Mas a animação das imagens tem feito igualmente o seu percurso na história, desde o remoto teatro de sombras, inventado pelos chineses, e chegado à Europa no séc. XVII, até outros como a lanterna mágica no séc. XVII, e os divertimentos óticos.

Também as teorias sobre a maneira como percecionamos o movimento foram evoluindo, tal como o próprio mecanismo da visão.

Imagem1Assim, considerando o globo ocular e o processo de apreensão da imagem: sabendo que a luz, refletida pelos objetos, entra na pupila, atravessa uma lente, o cristalino, e é projetada, invertida, na retina, onde existem milhões de células como, por exemplo, os cones e os bastonetes que nos permitem ver o mundo a cores. Os cones reconhecem as cores e, os bastonetes, a luminosidade. À noite, só os bastonetes funcionam, enquanto os cones ficam inativos, daí não vermos as cores, no escuro. Também uma anomalia nestas células, pode originar o daltonismo, dificultando o reconhecimento das cores.

A imagem ao ser projetada invertida, na retina, é, contudo, posicionada corretamente pelo cérebro.

No seguimento deste processo, a imagem permanece na retina durante uma fração de segundo após esta se afastar do campo visual.

De acordo com a teoria da persistência retiniana ou persistência da visão, se for apresentada uma sequência de imagens, a uma velocidade superior a dezasseis imagens por segundo, estas, fundem-se umas nas outras não havendo qualquer interrupção devido a essa breve permanência da imagem anterior, e originando a sensação de movimento.

Em 1912, o psicólogo checo, Max Wertheimer, um dos fundadores da Teoria da Gestalt, desenvolveu experiências em que separa diferentes movimentos: o movimento beta, segundo o qual, perante duas imagens projetadas numa tela, em extremidades opostas e em rápida sucessão, são percecionadas como apenas uma imagem que atravessa o espaço e provoca a ilusão de movimento. Este movimento beta é vulgarmente confundido com o fenómeno phi que consiste em mostrar separadamente, duas linhas que se acendem e apagam em rápida sucessão e num curto intervalo de tempo, levando o observador a afirmar ter percecionado movimento entre as duas.

Outros estudos concluem que apenas o movimento percecionado nos brinquedos óticos está de acordo com os movimentos phi e beta, não incluindo aqui o movimento do cinema, a não ser  como uma definição para a ilusão de movimento na teoria do cinema. Porém, outras questões surgem como a contestação ao conceito de observador passivo onde as imagens se projetam passivamente na retina sem que ele participe no que vê. Quer no cinema, quer na vida real, a interação com o que nos rodeia obriga a uma solicitação constante com o que se insere no campo visual, mas também com o que está fora e é essa ligação entre a nossa ação, os ângulos, a aproximação e o afastamento e o mundo em movimento que não cabe numa definição estática. O próprio Wertheimer afirmou não ser possível formular, considerando somente um processo periférico que ocorre no globo ocular, devendo examinar-se processos que se desenvolvem além da retina.

A construção de alguns brinquedos óticos em contexto de sala de aula, ilustra o processo de desenvolvimento e o fascínio do aparecimento da animação, tão diferente do que, atualmente, assistimos, onde a dinâmica do mundo virtual em que a imagem, o som e o texto acontecem em simultâneo e onde as inovações não cessam de nos surpreender, e onde a noção de tempo, tão díspar do ritmo cadenciado da primeira, se automatiza em gestos e movimentos que não contemplam recuos. Realizar um engenho destes é fazer um trajeto no tempo e experimentar a magia e a euforia dos primeiros inventores, é  compreender o fenómeno da persistência retiniana e deleitar-se com o objeto estético.

Ana Guerreiro

Read Full Post »

743px-Ernte_in_der_Provénce

Há algo neste quadro que logo me desperta uma emoção. Alegria. A simpleza da paisagem e o seu tom quente e acolhedor, presumo, estão na origem do problema. Problema porque logo, logo, começo a pensar “porquê?”. Porquê esta emoção? Será que imagino alguma memória inexistente na qual me embrenho, confundindo os indistinguíveis sonho e realidade? Ou será que imagino uma simples canção, talvez, ecoando ondeante no pensamento, como um “comboio de corda”? E mais importante, ao contrário de Fernando Pessoa, será que esta alegria me durará? Acho que já falhei.

É a resposta a que Fernando Pessoa chega – quando se pensa, não se sente. A emoção é algo espontâneo. Porque é ao observarmos mais de perto algo, que começamos a reparar em pormenores que logo desfazem a imagem no seu contexto total. Apercebemo-nos de todas as pequenas imperfeições, que rasgam, ferozmente, as emoções antes sentidas.

Esta pintura de Van Gogh, “Moisson en Provence”, por exemplo, observada com uma consciência nula, faz-nos sentir felicidade: a paz do campo e as cores provincianas sossegadas; a moleza do quente, e das férias. Mas é procurando ao fundo, lá bem longe, já conscientes, que percebemos umas manchas esbatidas de tristeza e frio.

É a essas manchas que Fernando Pessoa chega, seja qual for o caminho que toma para tentar alcançar a inalcançável alegria, por não ser capaz de deixar de pensar. Aliás, pensa tanto que já nem sabe bem quem é. Já não se reconhece – “Eu vejo-me e estou sem mim, / Conheço-me e não sou eu.” – nem reconhece quem foi – “Se quem fui é enigma”.

Pessoa fica, assim, preso num abismo eterno, vendo por vezes momentaneamente a luz da alegria, desfeita em seguida, desejando a cada momento que pare de pensar, e sinta “Isto” no seu coração.

Guilherme Dias, 12ºC

Read Full Post »

logos

Com vista à participação num encontro do projeto Erasmus+ da escola a decorrer em Eutin, Alemanha em março de 2022, convidam-se os alunos a apresentar a sua candidatura para seleção de quatro participantes que irão representar a escola. Esta candidatura consiste numa apresentação/análise de um filme recorrendo a conteúdos científicos de, pelo menos, duas disciplinas entre as quatro que estão envolvidas: matemática, física, química e biologia. 

Esta apresentação será feita oralmente em inglês e os critérios para a sua avaliação terão em conta méritos académico-científicos (rigor, relevância e interdisciplinaridade), comunicacionais (capacidade de expor um tema, vivacidade e clareza) e linguísticos (fluência e correção em língua inglesa) e criativos.

    • Os alunos interessados deverão aceder a um formulário online para identificação como candidatos e apresentação de um plano sobre o que pretendem realizar até 17 de dezembro de 2021
  • Os alunos que passarem o processo de pré-seleção serão avisados por email em 22.12.21;
  • As apresentações para seleção dos alunos participantes decorrerão no dia 12.1.22, da parte da tarde (em caso de necessidade, recorrer-se-á ao dia 13.1.22).

Acede ao guião de candidatura ao encontro  para saberes como te candidatar e, se decidires candidatar-te, preenche este formulário.

Quaisquer dúvidas poderão ser esclarecidas junto dos professores da equipa E+: Fernando Rebelo, Ana Cristina Santos, Carla Vaz, Paula Paiva e Ana Noválio (na BE).

Read Full Post »