No dia vinte e três de março, no Centro Cultural de Belém, foram entregues os Prémios Sophia, da Academia Portuguesa de Cinema, que contemplou o filme Cartas de Guerra de Ivo Ferreira com 9 das 21 estatuetas distribuídas, entre as quais as de Melhor Filme e Melhor Realização. Esta obra que tinha 11 nomeações foi feita a partir da correspondência entre o escritor António Lobo Antunes e a primeira mulher, Maria José, quando esteve destacado em Angola, durante a Guerra Colonial: “Cartas da Guerra” deixa um retrato sobre “a maior tragédia portuguesa do século XX”, como o realizador disse à Lusa, quando a longa-metragem teve estreia em sala, em setembro do ano passado.
A memória da Guerra Colonial passa igualmente por “Estilhaços”, de José Miguel Ribeiro, que juntou o Prémio de Melhor Curta-Metragem de Animação, ao seu rol de distinções enquanto Balada de um Batráquio de Leonor Teles recebeu o Sophia de Melhor Documentário em Curta-Metragem. A Academia Portuguesa de Cinema distinguiu ainda o ator Ruy de Carvalho com o Prémio Mérito e Excelência, assinalando os seus 90 anos de vida e 75 de carreira assim como atribuiu os prémios Sophia Carreira à atriz Adelaide João e ao diretor de fotografia Elso Roque.
Quanto a estreias, começo com filmes de ficção científica com o interessante O Espaço Que Nos Une de Peter Chelsom, uma forma diferente e curiosa de abordar este género numa história de amor e de perda a partir da primeira missão de colonização do planeta Marte e das dúvidas e interrogações do primeiro humano nascido no planeta vermelho. Igualmente de ficção científica, o thriller espacial Vida inteligente de Daniel Espinosa remete-nos para a série de culto Alien e, por isso, aguarda-se a sequela desta obra claustrofóbica. A recolha de uma amostra do solo de Marte por um grupo de cientistas da estação espacial internacional conduz não só à primeira prova de existência de vida extraterrestre como também é o ponto de partida para momentos de tensão e um conjunto de acções violentas e sangrentas que levam a classificar esta obra também de terror.
Para os apreciadores de argumentos românticos e baseados em factos verídicos Um Reino Unido de Amma Asante a partir de factos ocorridos no final da década de 40 do século XX envolvendo o casamento do príncipe herdeiro do Botswana, Seretse Khama e Ruth Williams, britânica e branca. Um amor que causou grande polémica pois o casal embora exilado do Botswana resistiu às pressões familiares e políticas, numa época em que o colonialismo e o apartheid sul africano dominavam, causando também solidariedade internacional. Quando o território se torna independente em setembro de 1966 Seretse Khama torna-se Presidente, cargo que ocupará até à sua morte em 1980.
Igualmente sobre relações amorosas e desejo feminino o filme francês Um Instante de Amor de Nicole Garcia baseado na obra homónima de Milena Agus com Marion Cotillard a brilhar no papel de uma mulher em conflito e na busca do amor numa sociedade conservadora no pós 2ª guerra Mundial. A Warner Bros. Pictures e Legendary Pictures e os japoneses da Toho recriam a origem do mítico King Kong em Kong: Ilha da Caveira numa emocionante e original aventura do realizador Jordan Vogt-Roberts . Neste filme a equipa de exploradores integra elementos ligados a departamentos governamentais e militares de que fazem parte os protagonistas Brie Larson como fotógrafa, Tom Hiddleston Samuel L. Jackson e John Goodman, nesta nova versão de exploração numa ilha desconhecida do Pacífico. A aventura original envolvendo esta figura clássica data de 1933 e, embora ao longo dos tempos tenha tido várias versões, o argumento baseia-se sempre na oposição entre o avanço tecnológico e os seres de um mundo primitivo.
Outra adaptação, mas neste caso do clássico de animação de 1991, A Bela e o Monstro de Bill Condon é uma versão com modernos efeitos especiais digitais que partilham com os atores a composição das cenas. Sem caráter lúdico, o horror do Holocausto serve de base a uma obra cinematográfica em Negação de Mick Jackson a partir de factos reais sobre a disputa judicial envolvendo uma historiadora do Holocausto e um negacionista do mesmo. Baseado no famoso livro “Denial: Holocaust History on Trial” que a historiadora norte-americana Deborah Lipstadt escreveu como ré no processo de difamação movido por David Irving que nega a existência do Holocausto. Com um excelente elenco é uma obra actual numa época em que vivemos com conflitos entre crenças religiosas e ideológicas esquecendo-se muitos factos históricos.
Também sobre memórias e resistência, temos a interessante obra do realizador brasileiro Kleber Mendonça Filho Aquarius, em que a veterana Sónia Braga interpreta uma viúva aposentada que recusa vender o seu apartamento lutando contra as pressões de que é vítima. Por fim, um divertido e comovente filme sueco nomeado para os Óscares de Melhor filme estrangeiro e de Melhor maquilhagem Um homem chamado Ove de Hannes Holm a partir do best seller homónimo de Fredrik Backman. Esta obra agradável consegue equilibrar situações de humor negro com os bons sentimentos de uma personagem que mantém as mesmas rotinas, zangas com os vizinhos e paixão pela mulher morta. É uma obra que enfatiza a importância da tolerância e da entreajuda na comunidade como forma das pessoas demonstrarem os valores e caráter que têm.
Luísa Oliveira