Nunca me vi nem achei
Fernando Pessoa
(in Não sei quantas almas tenho)
Este verso será, provavelmente, o que melhor ilustra a maneira como Fernando Pessoa via a sua identidade.
Fernando Pessoa era um poeta e, sobretudo, uma pessoa que tinha grandes dificuldades em definir-se enquanto identidade, ou seja, sentia-se “perdido” em si próprio. Encontrava-se constantemente em conflito interior, acabando por se questionar se realmente existia e, se existisse, quem era na realidade.
Esta incapacidade que sentia em autodefinir-se levou Fernando Pessoa a procurar uma solução, isto é, a encontrar uma identidade que o representasse. Deste modo, Pessoa chegou à conclusão que, em vez de criar uma identidade, porque não criar várias identidades que demonstrassem as suas diversas formas de olhar para o mundo, de interpretar o que o rodeava?
Mas até sobre a finalidade das identidades criadas, que se denominam heterónimos, Pessoa não tinha uma ideia definida. Os heterónimos criados serviam tanto para exprimir o que sentia o próprio, como também para exprimir emoções criadas/fingidas por ele, já que ele afirma (no poema Autopsicografia) que o “poeta é um fingidor”.
Assim, nascem vários heterónimos com estilos de escrita distintos, de entre os quais podemos destacar três que são bastante diferentes entre si: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos.
Alberto Caeiro, o mestre, é um heterónimo bastante ligado à natureza e aos cinco sentidos. Para Caeiro, o que importa é o que os seus sentidos conseguem captar, acabando por contemplar o mundo que o rodeia de forma ingénua e objetiva. Assim, Caeiro não pensava no futuro nem no passado, acabando por não dar importância ao que pensava, mas só ao que captava com os seus sentidos.
Ricardo Reis é um heterónimo que vive o presente sem exageros e que tenta aproveitar o momento presente na sua totalidade. Ricardo Reis afirma que não vale a pena viver a vida com grandes exageros, nem ceder às paixões que sente, porque o fim será o mesmo para todas as pessoas, a morte. Deste modo, ao não ceder à paixão que sente, Reis considera que, quando chegar o seu fim, a pessoa amada não irá sentir a tristeza que sentiria caso fossem comprometidos. Tal como Caeiro, Ricardo Reis valoriza a natureza.
Por fim, Álvaro de Campos distingue-se dos outros exemplos por ser um heterónimo que valoriza o mundo contemporâneo e a agitação das cidades. Teve duas fases distintas: a fase futurista onde sente intensamente a agitação das novas invenções que o rodeiam, querendo “ser toda a gente em toda a parte”; e a fase intimista, onde acaba por cair numa angústia, tristeza e deceção, pois apercebe-se que não pode sentir tudo na sua totalidade (“Ah, não ser eu toda a gente em toda a parte!”).
Podemos assim associar Fernando Pessoa e as suas identidades criadas a um puzzle porque, se cada heterónimo criado representar uma peça, estas irão encaixar umas nas outras, pois complementam-se, acabando por formar uma única unidade que representa Fernando Pessoa.
Raquel Cardoso, 12ºA
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