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Archive for Fevereiro, 2015

Nunca me vi nem achei

Fernando Pessoa
(in Não sei quantas almas tenho)

Este verso será, provavelmente, o que melhor ilustra a maneira como Fernando Pessoa via a sua identidade.

Fernando Pessoa era um poeta e, sobretudo, uma pessoa que tinha grandes dificuldades em definir-se enquanto identidade, ou seja, sentia-se “perdido” em si próprio. Encontrava-se constantemente em conflito interior, acabando por se questionar se realmente existia e, se existisse, quem era na realidade.

Esta incapacidade que sentia em autodefinir-se levou Fernando Pessoa a procurar uma solução, isto é, a encontrar uma identidade que o representasse. Deste modo, Pessoa chegou à conclusão que, em vez de criar uma identidade, porque não criar várias identidades que demonstrassem as suas diversas formas de olhar para o mundo, de interpretar o que o rodeava?

Mas até sobre a finalidade das identidades criadas, que se denominam heterónimos, Pessoa não tinha uma ideia definida. Os heterónimos criados serviam tanto para exprimir o que sentia o próprio, como também para exprimir emoções criadas/fingidas por ele, já que ele afirma (no poema Autopsicografia) que o “poeta é um fingidor”.

puzzleAssim, nascem vários heterónimos com estilos de escrita distintos, de entre os quais podemos destacar três que são bastante diferentes entre si: Alberto Caeiro, Ricardo Reis e Álvaro de Campos.

Alberto Caeiro, o mestre, é um heterónimo bastante ligado à natureza e aos cinco sentidos. Para Caeiro, o que importa é o que os seus sentidos conseguem captar, acabando por contemplar o mundo que o rodeia de forma ingénua e objetiva. Assim, Caeiro não pensava no futuro nem no passado, acabando por não dar importância ao que pensava, mas só ao que captava com os seus sentidos.

Ricardo Reis é um heterónimo que vive o presente sem exageros e que tenta aproveitar o momento presente na sua totalidade. Ricardo Reis afirma que não vale a pena viver a vida com grandes exageros, nem ceder às paixões que sente, porque o fim será o mesmo para todas as pessoas, a morte. Deste modo, ao não ceder à paixão que sente, Reis considera que, quando chegar o seu fim, a pessoa amada não irá sentir a tristeza que sentiria caso fossem comprometidos. Tal como Caeiro, Ricardo Reis valoriza a natureza.

Por fim, Álvaro de Campos distingue-se dos outros exemplos por ser um heterónimo que valoriza o mundo contemporâneo e a agitação das cidades. Teve duas fases distintas: a fase futurista onde sente intensamente a agitação das novas invenções que o rodeiam, querendo “ser toda a gente em toda a parte”; e a fase intimista, onde acaba por cair numa angústia, tristeza e deceção, pois apercebe-se que não pode sentir tudo na sua totalidade (“Ah, não ser eu toda a gente em toda a parte!”).

Podemos assim associar Fernando Pessoa e as suas identidades criadas a um puzzle porque, se cada heterónimo criado representar uma peça, estas irão encaixar umas nas outras, pois complementam-se, acabando por formar uma única unidade que representa Fernando Pessoa.

Raquel Cardoso, 12ºA

imagem daqui

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concurso Saramago

‘Quem conta um conto… ao modo de Saramago!?’ lança um desafio aos jovens que queiram ousar a sua primeira experiência de escrita, através da criação de textos originais com inspiração na obra Memorial do Convento, utilizando as competências justas para a produção literária sob a forma narrativa do ‘conto’. SABER +

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amorRealizado no âmbito de uma atividade da turma na aula de Português – Correio Amoroso – a pretexto do S. Valentim e inspirado na lírica camoniana.

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ea

(desenho de Paolo Romani via Pinzellades al món)

E porque namorar não é tratar mal o outro, pois a violência não tem nada a ver com o amor, acompanhe a campanha da APAV contra a violência no namoro.

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clique para ficar a conhecer a evolução deste meio de comunicação

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imagem editada daqui

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clique para mais informação

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Com a massificação do acesso à internet e às redes sociais, o conceito de informação e comunicação ganhou uma dimensão que não poderíamos sonhar há apenas alguns anos. Com essa velocidade e facilidade, que sem dúvida abriu um enorme campo a explorar na interação humana e na aprendizagem, veio também o seu lado negro – as crianças e os jovens não estão agora só expostos aos perigos do mundo físico e presencial do dia a dia, mas também a todo o tipo de consequências que um uso menos experiente e lúcido desse outro mundo virtual pode acarretar. Tal como educa os seus jovens para uma sexualidade sã e feliz, longe das práticas de um moralismo proibicionista, a escola deve educar agora para uma vivência e convivência virtual que potencie os seus aspetos mais positivos e diminua os seus riscos.

Por tudo isto é importante que, mais que um dia, esta educação faça parte da cultura letiva da escola no sentido de uma cidadania digital madura. Assim, a SeguraNet disponibiliza uma série de recursos para educadores e educandos a não perder, especialmente aqueles professores que, no nosso agrupamento, em particular no 7ºAno, este ano letivo lecionam o módulo de Boas Práticas na Internet, que dispõe de um guião curricular e um biblioteca de recursos aqui no Bibliblog.

Lembramos ainda que irá decorrer hoje uma Ação de sensibilizaçãoInternet Segura“, promovida em parceria pela GNR e pela Microsoft, destinada aos alunos do 2º e 3º ciclos do agrupamento, representados pelo delegado e subdelegado de cada turma, que posteriormente transmitirão aos colegas a informação que receberam.

Ajudemos então os nossos alunos a tornarem-se cidadãos digitais habilidosos mas lúcidos.

Fernando Rebelo

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imagesUm altifalante consiste num dispositivo eletromecânico que converte energia elétrica, fornecida por um amplificador de potência de audiofrequência, em energia sonora.

As ondas sonoras são transmitidas para a audição de um certo número de pessoas em contraste com o telefone, que é útil para uma só pessoa.

O altifalante é o aparelho que se coloca em último num sistema de amplificação de som.

Normalmente um altifalante é constituido por uma membrana vibrátil, o diafragma, ligado a uma bobina que se encontra num campo criado por um íman permanente. A forma e dimensões do diafragma dependem da potência de saída e das características pretendidas como sensibilidade, direcionalidade, rendimento acústico e fidelidade.alto-falante-grc3a1fico

A palavra ou música chegam na forma de oscilações de uma corrente elétrica que cria um campo magnético. Esta faz com que a membrana seja atraída ou repelida alternadamente, de maneira a oscilar do mesmo modo que a corrente elétrica. Os altifalantes podem ser classificados consoante o tipo de bobina existente. Assim estes podem ser divididos em: altifalante eletromagnético, altifalante eletrodinâmico, altifalante eletrostático e altifalante piezelétrico.

Os altifalantes podem ainda ser classificados em altifalante para altas-frequências e altifalantes para baixas frequências. Quanto ao primeiro, este consiste num altifalante de pequenas dimensões capaz de reproduzir sons de frequência relativamente elevados. Quanto ao segundo, este consiste num altifalante de grandes dimensões destinados a reproduzir sons de frequência relativamente baixas.

Joana Frade, 11ºC

imagens daqui e daqui

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Meus dias, mas que um passe e outro passe/ Ficando eu sempre quase o mesmo; indo/ Para a velhice como um dia entra no anoitecer

Ricardo Reis

RR

Ricardo Reis, crente no paganismo, nasceu no Porto a 19 de Setembro de 1887. Estudou num colégio jesuíta e formou-se em Medicina. O facto de ser monárquico obrigou-o a exilar-se no Brasil em 1919, na sequência da rebelião monárquica que se sucedeu no Porto.

Na sua obra, o heterónimo de Fernando Pessoa brinda-nos com um conjunto de máximas, que o próprio traça para a sua vida.

A consciência aguda da passagem inexorável do tempo e a impotência do ser humano para “lutar” contra essa inevitabilidade é um dos assuntos mais abordados na sua poesia.

Esta passagem inevitável do tempo remete-nos para o estoicismo, que é uma filosofia que nos obriga a aceitar e reger a nossa vida pelas leis gerais da natureza e do destino, tal é o caso deste heterónimo que teve a capacidade de perceber a necessidade de nos regermos por tais leis.

Desse modo, podemos considerar que na base da nossa ilha, que é a vida, temos o mar, o nosso destino, do qual não poderemos escapar – “Nem cuidados, porque se os tivesse o rio correria/ E sempre iria ter ao mar”.

Como isto acontece, ou seja, o passar dos nossos dias, o intercalar do dia e da noite, nos levam a rumar em direção à velhice, ao mar, ao destino e por isso à morte, devemos ser capazes de nos distanciar um pouco do destino. Isto é, fazer a nossa ilha pairar, para que assim possamos aproveitar a vida, mas sempre com tranquilidade face ao dia, às paixões, e às alegrias, para que quando a noite, as tristezas, as desilusões chegarem, ficarmos indiferentes a tudo o que nos poderia de alguma forma atormentar.

Assim, devemos ser a palmeira no centro da nossa ilha suspensa, tal como Ricardo Reis o era: o equilíbrio entre o dia e a noite, sermos acima de tudo o presente, mas nunca esquecendo que o futuro acabará por vir e, por fim, termos a sabedoria de gozar e aproveitar esse presente (carpe diem) “Colhe o dia, porque és ele.”

Estamos assim perante mais uma das máximas de Ricardo Reis, o epicurismo, que nos mostra a importância de termos um equilíbrio na nossa vida, sabermos procurar os simples prazeres da vida, mas sem excessos, aprendendo assim a viver cada instante como se fosse o último.

Por fim, podemos então considerar que devemos ser um equilíbrio entre o dia e a noite, isto porque tudo o que o dia nos possa trazer de bom, ao vivermos as coisas com intensidade, quando chega a noite, com ela veem certamente coisas menos boas causadas por essa vivência excessiva Por esse motivo, devemos distanciar-nos tanto das coisas boas como das más, para que possamos viver com tranquilidade a nossa vida efémera.

Rita Carvalha, 12ºA

Fonte da imagem – aqui

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Enquanto se aguarda pela cerimónia de entrega dos Óscares, em 22 fevereiro, os nomeados nas várias categorias têm sido reconhecidos nas inúmeras cerimónias de consagração que antecedem o evento maior. Mas antes da indicação de alguns dos candidatos os cinéfilos deliciaram-se com a estreia, no mês de janeiro, de alguns dos filmes favoritos. No entanto, a referência especial vai para o vencedor da Palma de ouro da 67ªedição do festival de Cannes o belíssimo sono de inverno do realizador turco Nuri Bilqe Ceylan rodado na enigmática Capadócia, Turquia, cenário de diálogos intimistas que analisam uma relação conjugal.

No que respeita aos nomeados para os Óscares da Academia de Hollywood Birdman ( ou a inesperada virtude da ignorância) de Alejandro González Iñárritu juntamente com o premiado Grand Hotel Budapest de Wes Anderson lideram com nove nomeações cada um. A comédia de humor negro de Alejandro Inárritu sobressai não só pela ótima fotografia e banda sonora como pela interpretação de Michael Keaton de um ator que pretende reerguer a sua carreira afastando-se da anterior personagem de super herói Birdman.

Outro candidato de qualidade com oito nomeações, O jogo de imitação, de Morten Tyldum relata alguns episódios da vida do genial matemático Alan Turing que, ajudando os serviços secretos ingleses, contribuiu para decifrar o código Enigma utilizado pelos nazis.Com uma excelente reconstituição da época e brilhante desempenho de Benedict Cumberbatch é uma obra aconselhável para conhecermos o importante contributo de um dos responsáveis pelo fim do sangrento conflito o que não impediu, no entanto, a perseguição de que foi vítima devido à sua orientação sexual continuando rodeada de mistério a sua morte em 1954.

Igualmente favorito A teoria de tudo de James Marsh com oito nomeações baseada na obra de Jane Hawking ex mulher do astrofísico Stephen Hawking, Viagem ao Infinito – A Extraordinária História de Jane e Stephen Hawking, retratando os 25 anos do casamento sendo que Eddie Redmayne ao representar o famoso físico é um dos candidatos ao Óscar de melhor ator. Stephen Hawking foi diagnosticado, aos vinte e um anos, com uma forma de evolução lenta da doença degenerativa de esclerose lateral amiotrófica o que não o impediu de se tornar um dos mais famosos e conceituados cientistas da atualidade conciliando a física quântica com a teoria da relatividade de Einstein. Desde 1985 que comunica através de uma voz sintética registando os seus pensamentos num computador com os dedos que conseguia mexer. Atualmente,com 73 anos, a doença continua a progredir e só consegue controlar o músculo da bochecha e é através de um sensor de movimento ligado a esse músculo que continua a partilhar as suas descobertas com o mundo.

Com seis nomeações, Sniper Americano de Clint Eastwood é uma narrativa biográfica sobre as missões no Iraque do texano Chris Kyle considerado o mais letal atirador da história militar dos Estados Unidos. Bradley Cooper e Sienna Miller encarnam de forma intensa o conflito emocional e pessoal do casal e, apesar do sucesso de bilheteira, o filme tem sido alvo de grande polémica e debate sobre a participação americana nos conflitos mundiais.

Whiplashnos limites de Damien Chazelle, que venceu o festival Sundance no ano transacto, é uma obra introspetiva sobre a busca obsessiva da perfeição e os limites que cada um deve ter quando se pretende atingir determinados objetivos.

Foxcatcher, um drama de Bennet Miller, com cinco nomeações, baseado nas memórias de Mark Schultz e no livro Wrestling with madness de Tim Huddleston apresenta a relação doentia e trágica do milionário John Du Pont e dos irmãos Schultz, medalhistas de ouro em luta greco-romana.

O musical Caminhos da floresta de Rob Marshall apresenta três nomeações entre as quais a 19ª de Meryl Streep num filme com diferentes personagens do universo das fábulas clássicas.  A esta obra junta-se também o curioso e original Boyhood – momentos de uma vida de Richard Linklater com seis nomeações que se estreou em dezembro passado e demorou 12 anos a gravar.

Mas, no clube restrito dos nomeados, não cabem outras obras que merecem também algum realce: Taken 3 de Olivier Megaton, um novo episódio da famosa saga de acção e aventura com Liam Neeson. Os fãs de Johnny Depp podem apreciar a sua prestação como marchand de arte à procura de um quadro roubado onde se esconde um tesouro nazi na comédia O excêntrico Mortedcai de David Koepp com Ewan McGregor, Gwyneth Paltrow e Jeff Goldblum nos principais papéis.

Angelina Jolie realizou Invencível sobre a odisseia do atleta olímpico Louis Zamperini capturado pelos japoneses durante a segunda guerra mundial. Baseado no livro de Laura Hillenbrand, Invencível: uma história de sobrevivência, resistência e redenção, o título reflete bem a experiência de vida do atleta que faleceu recentemente.

Com um tema, infelizmente, sempre atual Rosewater-uma esperança de liberdade é o primeiro filme realizado pelo famoso comediante Jon Stewart a partir da história verídica do jornalista Maziar Bahari que, preso e torturado no Irão, mantém a esperança e fé na luta pela mudança. Finalmente, para os fãs de ficção científica Autómata de Gabe Ibánez.

O restaurado cinema Ideal, na rua do Loreto em Lisboa, apresentou um programa especial para comemorar não só o dia internacional em memória das vítimas do Holocausto em 27 janeiro, como também os 70 anos do fim da 2ª guerra mundial. Nesse sentido além da reposição, em versão digital, do Grande Ditador de Charles Chaplin apresentou três excelentes documentários: o último dos injustos de Claude Lanzmann sobre a génese da solução final e do assassino Eichmann; A noite cairá de André Singer com terríveis imagens de arquivo filmadas quando da libertação do campo de concentração de Bergen-Belsen que os interesses políticos após o conflito não permitiram que fossem montadas por Alfred Hitchcock como estava previsto e O homem decente de Vanessa Lapa que aborda a vida e a mente de uma das mais tenebrosas figuras do nazismo: Heinrich Himmler, considerado o “arquiteto da solução final”. Obras importantes para que “a memória não se apague”.

Luísa Oliveira

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No séc. XIX, quando Edgar Degas pintou aquele quadro, não tinha, provavelmente, conhecimento de que, tão cedo, ninguém ousaria trazer a público um assunto tão sensível como esse que representou.

O próprio nome do quadro surge envolvido num certo pudor que ora oscila entre Violação, ora entre Interior, e cujo conteúdo aborda a violência no interior da casa, mais concretamente a violação sexual.

Este assunto, tabu, é único na sua obra – a profusão de bailarinas, os gestos, a leveza dos movimentos que retratou tantas e tantas vezes não fariam supor que algo tão denso manchasse o seu trabalho pictórico.

fig.1 - Degas

fig.1

No interior de um quarto há uma linha estrutural da composição que condensa em si toda a tragédia aí ocorrida. Uma figura feminina que fraqueja sobre um cadeirão e, no extremo da linha, um homem, um homem que impede a passagem. Em redor, um casaco masculino sobre a cama, um traço de sangue na colcha, uma peça íntima de roupa feminina sobre o chão e a aparente quietude do quarto suscitam no observador um estranho desconforto.

Degas dá visibilidade a este assunto nesta única obra, embora nunca tivesse sido exposta nem vendida enquanto o autor foi vivo.

Mais recentemente, Pilar Albarracín, uma artista espanhola, de Sevilha, apresenta um conjunto de narrativas, com técnicas que vão da fotografia à instalação e à performance, entre outras, que refletem sobre a vida da mulher na sociedade e o absurdo do dia a dia. Na série Diálogos imposibles representa umas facas bordadas a preto, sobre tecido branco, com uma pequenina mancha vermelha. Enquanto o bordado é tradicionalmente representado com motivos pueris, geralmente florais, aqui os motivos sugerem outras realidades que a autora quer desocultar.

fig. 2

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Este tema da violência exercida dentro de casa é perturbador, não só pelo tema em si como também pelo lugar onde se encerra.

A casa é um ponto de referência na vida do ser humano, o lugar onde se constitui a família, a segurança, a intimidade, os sonhos.

Há muitos milhares de anos, quando o Homem se tornou sedentário, a necessidade de abrigo e de proteção dos animais selvagens e das intempéries deu origem ao aparecimento da casa. Era, inicialmente, um espaço coberto em volta de uma fogueira, mas o calor terá tocado corações e despertado consciências.

Aos poucos, ou por momentos, surgiram gestos, indícios de afeto que predispuseram a uma aproximação, ganhando o lugar nova importância, representando o sítio onde se alicerçam os afetos e onde os sonhos despontam. Surge a maternidade, a educação dos filhos e as práticas domésticas, são as mulheres que cuidam do fogo e se dedicam a atividades manuais e artísticas, são elas que conferem um poder natural à casa. A representação de pequenas estatuetas femininas desses primórdios do tempo fazem-lhe o elogio.

Desde esse tempo até à atualidade, a casa evoluiu, ganhou significados, contraditórios às vezes, pois se por um lado mantém presente a chama que, perante as incertezas e a dispersão do exterior, agrupa e estrutura o ser volátil que somos, por outro, tornou-se num objeto bem diferente, na forma de habitar, do tempo em que se nascia e morria na mesma casa e se assistia à presença inalterável do mesmo mobiliário e objetos. Hoje, a casa acompanha o desenvolvimento dos tempos junto com os seus moradores, sendo considerada um objeto onde se projetam desejos e fantasias, onde os eus se espelham e onde se procura obter um status que é inerente à casa que se possui, acreditando-se, assim, ser possível viver num invejável modelo de felicidade.

A decoração e os objetos, ao contrário dos que existiam em épocas passadas que eram simplesmente mantidos pela família numa continuidade de lembranças e de respeito aos antepassados, não têm ainda uma biografia constituída pela história dos percursos e dos seus proprietários, são peças de autor, originais, que promovem o status e o bom gosto dos moradores.

E, se nem todos conseguem atingir este patamar de satisfação, ele permanece como ideal de existência feliz.

Mas há casas, como houve em todos os tempos, sem coração que  são espaços ambíguos onde se desenrolaram e desenrolam episódios de violência.

Espaços que perderam a dignidade, onde a agressividade habita e se solta indiferentemente pelos espaços, mais ou menos ricamente decorados , casas encantadas que se tornam lugares de inquietação e horror, e às mulheres, que um dia sonharam ser princesas em casas de encantar, como as dos contos juvenis e das revistas ao lado de príncipes belos e valentes, o que lhes resta?

Rasgar o silêncio de algumas casas é o que faz Saint Hoax, um artista do Médio Oriente, que criou uma campanha Happy Never After, utilizando princesas da Disney como vítimas da violência doméstica.

Ou Alexsandro Palmobo, artista italiano, que lançou, igualmente, uma campanha No Violence Against Women, onde utiliza personagens de filmes de animação americanos para retratar o mesmo problema.

Ana Guerreiro

Fontes das imagens:

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