GLÚTEN
Com certeza já deve ter ouvido falar do glúten, sobretudo nas redes sociais. Há uns anos, houve grandes polémicas sobre o glúten, que punha as pessoas mais “cheiinhas” e com maior peso. Também houve quem achasse que o glúten, por ser apenas um tema contemporâneo, fora um subproduto do processamento industrial dos alimentos…
Pois bem, fique sabendo que o glúten é uma proteína presente em vários tipos de farinha e que não é, de longe, algo moderno. O glúten é um composto de proteínas compostas por componentes mais simples. Estes componentes armazenam os hidratos de carbono e são digeridos em aminoácidos que entram na corrente sanguínea. Assim sendo, a quantidade de hidratos de carbono no sangue é mantida em valores estáveis, mesmo com o consumo de bastantes alimentos com glúten. Isto contraria o mito de que o glúten engorda – o glúten é uma proteína inócua a grande parte das pessoas e até é boa para a saúde. O que realmente faz uma pessoa mais volumosa é o consumo de hidratos de carbono a mais, não é o consumo de glúten.
No entanto, as pessoas com doença celíaca têm problemas com o consumo de glúten…, mas porquê? O que acontece é que, enquanto que numa pessoa normal o glúten é digerido pelos aminoácidos na corrente sanguínea, numa pessoa portadora de doença celíaca ou com alergias ao glúten as enzimas que digerem o glúten não são produzidos em número suficiente ou não são mesmo produzidos, provocando consequências graves. A grande quantidade de glúten no sangue pode provocar indisposição estomacal, danos na mucosa intestinal, lesões na pele (dermatite herpetiforme), diarreia, dor ou inchaço abdominal.
Como se estes sintomas já não bastassem, a recuperação da doença celíaca é lenta e qualquer ingestão de glúten durante a recuperação pode atrasar todo um processo de semanas ou meses. Por isso é que é tão importante perceber antecipadamente se uma pessoa é portadora de doença celíaca. Afinal de contas, esta doença não é assim tão rara: 30% da população mundial ou 2,35 mil milhões de pessoas sofrem com ela.
Então, em que cereais podemos encontrar o glúten? Pois bem, o glúten aparece nas sementes dos cereais da família das gramíneas e sobretudo na tribo Triticeae, onde se incluem espécies como o trigo, a cevada, o centeio e o triticale. Estes cereais são compostos por perto de 7 a 15% de proteínas, entre as quais proteínas correspondentes às do glúten. Também são constituídos por 40 a 70% de amido, um hidrato de carbono de armazenamento de alimento para as plantas, e por 1 a 5% de lípidos. Por causa da sua estrutura bioquímica, o glúten é também chamado de “glúten triticeae” e, mais popularmente, por “glúten de trigo”. Portanto, podemos concluir que estas proteínas são uma parte fundamental da composição dos cereais aparentados com o trigo.
Outros cereais, como a aveia, não apresentam naturalmente glúten, mas como são, muitas vezes, processados em fábricas onde também é processado o trigo, a aveia acaba por ficar contaminada com glúten também. Assim sendo, quem é portador de doença celíaca deverá ter em atenção o rótulo dos produtos de aveia para confirmar se realmente estão contaminados ou não.
Mudemos de tema e falemos doutra coisa… será que o glúten tem algum efeito naquilo que cozinhamos com a farinha?
Vejamos: o glúten, para além de ser constituído por duas enzimas que armazenam hidratos de carbono – as prolaminas e glutaminas – este composto também é constituído por outras duas enzimas: a albumina e a globulina. Estas enzimas são hidrofóbicas, isto é, não são solúveis em água, no entanto criam interagem com a molécula de água. Estas interações provocam a coesão dos vários grãos de farinha que, de outra maneira, estariam soltos, e tornam a farinha mais elástica e viscosa. Quando a farinha deixa de estar em contacto direto com a água, as duas proteínas principais, ou seja, as que normalmente teriam como função armazenar hidratos de carbono (a prolamina e a glutamina), preservam-nas e mantêm a massa coesa. É por isso que a farinha não se desintegra quando seca…
Está bem, é certo, mas então o que acontece quando a massa vai ao forno? Pois bem, surpreenda-se, pois o glúten também é, em parte, responsável pelo aumento do volume da massa durante a cozedura! Como muita gente deve saber, quando a massa vai ao forno ocorre fermentação. A fermentação é um processo em que pequenos microrganismos se alimentam dos hidratos de carbono da massa, libertando gases neste mesmo processo. Esses gases são sobretudo dióxido de carbono e álcool etílico vaporizado pelo calor do forno. Numa situação normal, os gases sairiam da massa e não haveria aumento do volume… e é aí que as proteínas do glúten entram em ação! A prolamina e a glutamina mantêm o dióxido de carbono dentro da massa, impedindo-a de sair dela e causando o aumento do seu volume. Assim sendo, o fabrico de pães sem glúten é considerado um grande desafio para a indústria e investigadores. A ausência de glúten na panificação tem um grande impacto nas propriedades viscoelásticas da massa, dando origem a massas pegajosas, pouco coesas e elásticas, e consequentemente, a pães com miolo compacto com reduzida porosidade, baixo volume e textura desintegrada. Por esta razão, nos últimos anos, têm-se criado alternativas para o fabrico de melhores pães sem a presença do glúten, como através do uso de amido gelatinoso ou mesmo de microalgas.
O etanol não é mantido dentro da massa porque o seu ponto de ebulição é muito superior ao do dióxido de carbono (75ºC contra -57ºC). Porquê? A razão até é simples… Muita gente deve ter reparado que, quando a água atinge o ponto de ebulição, a evaporação é bastante rápida: isto ocorre porque as moléculas encontram-se bastante instáveis. É devido a essa instabilidade que o álcool não é fixado pelas proteínas do glúten – é que, enquanto o dióxido de carbono emitido durante a fermentação encontra-se relativamente estável por se encontrar já em estado gasoso, o etanol está inicialmente em estado líquido, mas rapidamente é transformado num gás, o que causa bastante instabilidade molecular, dificultando a sua fixação pelo glúten. É por essa razão que o pão não possui álcool, ao contrário de outros produtos fermentados com cereais, como a cerveja…
Após a cozedura, o volume mantém-se, e tal deve-se à coagulação do glúten. Tal como grande parte das proteínas, o glúten perde atividade vital quando as temperaturas são demasiado elevadas, ou seja, perde atividade vital. Concluindo, no início da cozedura esta proteína fixa os gases e cria volume à massa, mas após algum tempo no forno tanto os microrganismos do fermento como o próprio glúten acabam por “morrer”, e a morte, como toda a gente sabe, é irreversível. Isto provoca a coagulação, ou seja, a solidificação das proteínas do glúten e que mantém o tamanho e o volume, mesmo depois de arrefecer! Isto também explica o porquê de, apesar de o glúten ser uma proteína e de os cereais terem na sua constituição até 15% de proteínas, os pães ou os bolos não conterem muita proteína – simplesmente ficaram sem atividade vital no processo e não têm qualquer valor nutricional para o ser humano.
Diogo Rodrigues, 11ºC
Bibliografia:
- https://www.nutergia.pt/pt/nutergia-conselheiro/conselhos-nutricao/especificos/intolerancia-ao-gluten.php
- https://www.tuasaude.com/gluten/
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Gl%C3%BAten
- https://en.wikipedia.org/wiki/Gluten
- https://gl.wikipedia.org/wiki/Glute
- https://planetabiologia.com/funcao-biologica-das-proteinas/
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Di%C3%B3xido_de_carbono
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Etanol
- https://brasilescola.uol.com.br/quimica/comparacao-entre-pontos-ebulicao-das-substancias.htm
- https://pt.wikipedia.org/wiki/Desnatura%C3%A7%C3%A3o
- https://www.infopedia.pt/$desnaturacao-proteica
- https://www.repository.utl.pt/bitstream/10400.5/17873/1/TESE_Joana%20Duarte_Definitiva.pdf
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